- O
Lopez é quem controla os carregamentos… - Maria ouvia atentamente, sentada no
sofá com uma chávena de chá a envolver-lhe as mãos – E eu não me consigo
lembrar de onde deixei aqueles quilos! – Abanou a cabeça, martirizando-se pela
incógnita que ele mesmo causou – Por isso é que a April não para de me chatear.
Ela é a comunicadora dele!
Jon
tragou o seu chá, à espera de mais perguntas por parte de Maria.
- Porque
é que fazes isso Jon? – Um rasgo de pena trespassou na sua voz – Tu aparentas
ter tanto dinheiro, porquê traficar droga?
Jon
riu-se perante pergunta tão perspicaz.
- Quando
entrei para o clube dos motards, não
sabia que ia ser assim. Pensei que servia para partilharmos o nosso gosto pelas
motas e tudo o mais! – Ao lembrar-se de alguns momentos passados no seio do
clube, não conseguiu evitar um sorriso – São boas pessoas! Mas depois o Lopez…
- Pensou que não havia como o descrever, não havia palavras que caracterizassem
uma personalidade tão acérrima como a dele – O Lopez meteu-se em sarilhos e
acabou por nos envolver a todos. Começou com pequenas quantidades, muitas vezes
nós nem sequer pegávamos num único quilo… mas depois começaram a chegar os
grandes carregamentos do México! Uns dias heroína, outros dias cocaína,
pastilhas… Sei lá! Mas todos os dias chegam, seja lá o que for. E todos os dias
temos de as transportar aos diferentes traficantes.
- E
quanto custava o carregamento que tu perdeste?
- Pouco
mais de seis mil dólares – Maria não conseguiu evitar a surpresa – Eram apenas
cinco quilos mas é uma droga nova que agora apareceu no mercado.
Maria
digeria tudo aquilo com o máximo de calma que lhe era possível. Bebeu um trago
do chá preto que Jon tinha preparado de propósito para os dois, talvez por
achar que era preciso algo aconchegante para acompanhar uma conversa tão pesada
e secreta como aquela. Jon não só estava a contar-lhe algo muito importante
acerca da sua vida como também a estava a incluir naquele secretismo. Ela sabia
as repercussões que poderiam advir caso alguém soubesse; e sobretudo, se alguém
soubesse que ela sabia. Aquelas informações não deviam circular fora do seu
grupo de amigos. Mas de alguma maneira, Jon confiara em si aquele assunto.
Sentia-se lisonjeada pela demonstração de confiança.
- Então
e o que achas que ele vai fazer? Tu vais ter de lhe pagar!
- Óbvio!
– Ele encolheu os ombros. Sabia que tinha de lhe pagar o dinheiro que as drogas
perdidas valiam, só não sabia como – Mas agora não tenho como arranjar o
dinheiro.
- Porque
é que não vendes a casa?
Maria
sabia que aquela proposta era ridícula. Aquela era a sua casa e embora
pairassem por lá más recordações, a mais presente seria certamente os tempos
felizes que lá tinha passado em família. Vende-la seria como livrar-se da
memória dos seus pais. Contudo, alguma coisa tinha de ser feita; Maria não
sabia até que ponto Lopez era perigoso e até onde iria para reaver o seu
dinheiro. Ou Jon se apressava a arranja-lo ou seria possível que não vivesse
muito mais para contar a história.
- A
casa? – Jon olhou à sua volta. Não teria nunca pensado nisso. Mas agora que a
proposta surgia não a considerou má de todo. Aquela casa era um poço de más
lembranças e só ele sabia o que lhe custava ainda habitar nela; de certa forma,
Maria tinha atenuado esse sentimento – Não era mau pensado.
- Eu
tenho algum dinheiro…
- Maria…
- Jon abanou a cabeça. Aceitar qualquer tipo de empréstimo estava fora de
questão – Eu meti-me nesta alhada, eu mesmo a resolvo. Apenas te contei porque
achei que devias saber, como vives aqui…
- Pois,
por isso mesmo! Eu vivo aqui e não pago absolutamente nada. Gostava de
contribuir de alguma maneira.
- Não
precisas! – Jon acabou de beber o chá e colocou-o em cima da mesa de centro – Se
eu colocar a casa à venda, mudas-te comigo para outro sítio?
- Como
assim?
Maria
também acabou o seu chá. Com um único gole, bebeu o que restava. Também ela o
colocou em cima da mesa, lentamente, ganhando tempo para pensar no que faria
perante a hipótese de Jon se mudar.
- Não
sei… - Ela encolheu os ombros – Eu acho que a minha estadia aqui vai acabar
mais depressa do que o previsto – Agarrou num elástico que tinha ao pulso e
enrolou nele o seu cabelo, fazendo um rabo-de-cavalo – Tenho de voltar!
Jon ia
perguntar-lhe o porquê de ela estar ali, considerando que aquele era o momento
certo. Mas Maria rapidamente o fez mudar de ideias: agarrou na revista mais
próxima e começou a folheá-la, dando um claro sinal de que não queria partilhar
com ele a sua vida. Mas Jon não estava preocupado com isso, ele era paciente e
iria esperar até Maria estar preparada para partilhar isso com ele.
Naquele
instante, o seu telemóvel tocou. Um curto mas alto bip fez-se ouvir e através desse som Jon percebeu que se tratava de
uma mensagem de texto. No ecrã podia ler-se: “Uma mensagem nova de April
Summers”. Levantou os olhos do ecrã para mirar Maria e percebeu que ela estava
entretida com o que lia – ou fingia estar – e abriu a mensagem, receoso do que
poderia encontrar.
“De:
April
Assunto:
Cowboy, o Lopez quer ver-te amanhã à noite, no Ritz Casino, em Houston. Traz a
tua namoradinha, o Lopez descobriu coisas acerca dela que vais gostar de saber.
Às 21h00, não faltes! Xoxo.”
Jon
engoliu em seco. Leu e voltou a reler a mensagem. Na sua cabeça, a frase “Traz
a tua namoradinha, o Lopez descobriu coisas acerca dela que vais gostar de
saber” ecoava e dava voltas e mais voltas, deixando-o ainda com mais medo do
que Lopez pudesse fazer. Claramente, ele não estava ali a brincar. Mas como
poderia ele saber algo acerca de Maria? Ela raramente saía de casa. E quando
saía nunca ia para os lados do clube – aliás, era impossível que ela
descobrisse aqueles caminhos. Aquilo para ele não passava de um negócio por
isso era óbvio que ele já tivesse posto mãos à obra. Deveria leva-la? Se o
fizesse, arriscava-se a que algo lhe acontecesse. Se não, arriscar-se-ia a ver
a sua vida por um fio. Pensou não uma, nem duas vezes e depois de recapitular
as hipóteses na sua cabeça, decidiu que ia leva-la. Mas será que ela deveria
saber o verdadeiro motivo da sua ida ao casino? Nem foi preciso pensar no
assunto. Maria não podia saber.
Trinta e
um de março de dois mil e onze
Maria
tinha acordado bem cedo naquela manhã. Normalmente, conseguia dormir mais um
pouco depois dos raios de sol trespassarem as cortinas da grande sala onde
ambos dormiam – em sofás separados – mas naquele dia, não conseguiu dormir nem
mais uns minutos. Acordou com o estranho pressentimento de que algo não ia
correr bem. Mas poderia não passar disso, de um pressentimento. Foi até à casa
de banho onde tomou um duche rápido e vestiu uns calções de fato treino e uma camisola
branca over size, largas e
descontraídas, assim como ela gostava.
Jon
dormia profundamente no seu sofá: tinha vestido apenas uns boxers, dando uma
perfeita visão do seu corpo escultural e definido; Maria considerou que ele
deveria ser, sem dúvida, um homem de trabalho. Aproveitando o facto de a casa
estar tranquila, sentou-se na mesa de jantar, depois de colocar à sua frente
uma folha branca a4 e uma caneta. Ia escrever para Anna. Ia ser a segunda carta
de que lhe enviava desde que tinha chegado Galveston. Na carta anterior, apenas
lhe tinha dito que se encontrava de boa saúde e a residir numa pensão, para
além, claro, dos sucessivos pedidos de desculpa. Anna não sabia onde ela estava
mas devia calcular pois ela sabia o paradeiro dos seus verdadeiros pais, apesar
de nunca lhe ter dito. Maria preferiu fazer tudo às escondidas quando começou a
investigar esse assunto. Certo dia, enquanto trabalhava na receção do orfanato
onde anos antes viveu, aproveitou o facto de estar a trabalhar sozinha para entrar
nos arquivos, lugar interdito a trabalhadores sendo que a única pessoa que
podia lá entrar era a diretora do sítio. Vasculhou todos os casos que lhe
apareceram à frente, até encontrar o seu e se deparar com o nome dos seus pais
biológicos, que a abandonaram com meses de vida. Olivia e Benjamin Portman. Pareciam nomes tão simples e bonitos mas
que lhe pesavam tanto na consciência. Era uma dor nova para ela mas uma dor que
lhe dava algum alento. Junto aos nomes aparecia também a sua morada –
Allexington Street, 964, Galveston/Texas. A primeira coisa que ela pensou foi
que não era muito longe do sítio onde se encontrava; com um pouco das
capacidades que aprendeu nos cinco anos de escuteiros conseguiria perfeitamente
aguentar a viagem. Só depois lhe ocorreu que passados dezoito anos, os pais
poderiam já não viver no mesmo local. Lembrava-se de se consciencializar que
era um risco, sem dúvida, mas um risco que ela estava disposta a correr se isso
significasse encontrar-se com os seus progenitores. E seria, certamente, uma
aventura para a vida, uma aventura que ela poderia partilhar com os seus filhos
e netos e orgulhar-se por não ter desistido de encontrar aqueles que lhe deram
vida.
“E aqui
estou eu!”, pensou, enquanto escrevia com a sua letra de primária, as primeiras
palavras no papel.
Jon
levantou-se uns minutos depois, provavelmente também incomodado com os
primeiros raios de luz e assim que ouviu os seus pés a tocarem no chão, Maria
limpou as lágrimas à palma da sua mão, lágrimas essas que já tinham manchado
praticamente todo o papel onde escrevia lentamente.
- Bom
dia! – Jon esfregou os olhos e dirigiu-se até à casa de banho em tronco nu,
proporcionando a Maria o que ela considerava ser uma visão do paraíso,
impossível de não se olhar – Já tomaste o pequeno-almoço? – Entrou na casa de
banho e fechou a porta.
- Ainda
não! – Respondeu Maria, um pouco mais alto para que Jon a pudesse ouvir do
outro lado – Tenho umas coisas para ir fazer à rua e vou comprar pão. Estou só
a acabar umas coisas…
-
Levantaste-te muito cedo! – Constatou ele, também num tom de voz mais alto.
- É…
Parca em
palavras para não adiantar mais nada sobre o vazio que dia após dia lhe
preenchia a alma, ela continuou a escrever, procurando encontrar naquelas
palavras alguma motivação que a fizesse avançar e a apresentar-se aos
verdadeiros pais. Só assim poderia sentir-se em paz e voltar para junto da
mulher que nunca a abandonou e que sempre acreditou nela.
Jon saiu
da casa de banho já devidamente vestido, emanando um cheiro contagiante. Passou
por ela mas não parou pois sabia que ela não gostava de ser incomodada quando
escrevia o que quer que fosse que ela passava para o papel. Aquelas cartas
intrigavam-no e, embora ele começasse a ficar impaciente, dar-lhe-ia todo o
tempo que ela precisasse para lhe contar.
- Estava
a pensar… - Esperou que ela olhasse para ele para poder prosseguir – Hoje à
noite podíamos ir ao casino… - Debruçou-se sobre a bancada da cozinha e cravou
os seus olhos azuis expectantes nos dela, esperando ansiosamente por uma
resposta positiva da sua parte – Não gostas de casinos?
- Hmmm –
Maria ajeitou-se na cadeira – Nunca fui a nenhum.
- E
gostavas de ir?
A
resposta afirmativa de Maria surpreendeu-o. Não era como se ela estivesse
entusiasmada mas já era o quarto dia que ela passava lá em casa e era bom
começarem a ter algo que fazer para além de assistir televisão, comer e dormir.
Isto era provavelmente o que ela pensava; já Jon desejava nunca ter de a
convidar. Pelo menos, nunca naquelas circunstâncias.
- Ok,
jantamos qualquer coisa aqui… - Jon ligou a máquina do café – E depois saímos
por volta das 20h30, o que achas? – Maria anuiu – Tenho lá em cima algumas
roupas da minha mãe, no terceiro quarto do corredor, dentro do armário. Estou a
dizer-te isto porque não deixam entrar de ténis, nem camisa ou calças…
Maria
franziu o sobrolho, desagradada com a ideia de ter de se produzir. Mas encarava
aquilo como um encontro. Num encontro normal ter-se-ia vestido sem cerimónias
mas tratava-se de um encontro com Jon, que parecia recheado de boas surpresas.
- Não,
deixa estar! – Dobrou o papel em dois, decidida a termina-lo mais tarde –
Depois de almoço vou até ao shopping
mais próximo e compro algumas roupas. Não trouxe quase nada, tinha de ser
prática…
Assim
como tinha dito, depois de almoço, Maria foi até ao shopping de Galveston fazer algumas compras. Tinha pensado muito
durante aquela manhã e estava decidida a fazer algumas mudanças; afinal, estava
em maré de mudanças! Durante uns tempos tinha-se mantido fiel ao seu estilo
descontraído e confortável, às suas botas pretas pelas canelas, aos seus
calções e calças de ganga e às suas t-shirts
largas mas agora achava que seria saudável juntar algumas coisas ao seu
guarda-roupa mais seletivo. Além disso, sentia necessidade de chamar a atenção
de Jon. Achava-o interessante, um poço de bondade e um dos rapazes mais bonitos
que já vira, apesar da sua baixa autoestima e confiança não deixarem transparecer
isso ainda mais. Não o via como um amigo, as coisas entre eles ainda eram
demasiado tensas para tal mas Maria acreditava que não é preciso uma amizade
para se despoletar algo mais. A caminhar pelos corredores apinhados de pessoas
e ao pensar nisso, Maria abanou a cabeça, inquietando-se com os seus
pensamentos ‘impróprios’.
Depois
de uma hora e meia entrando e saindo nas mais variadas lojas, Maria contava com
uma dúzia de sacos, muitos deles com mais do que uma peça, encontrando-se entre
as quais vestuário que ela nunca tinha pensado comprar: vestidos casuais e dois
mais elaborados para vestir para o casino, saias dos mais variados tipos,
sapatos de salto, assim como ténis desde a marca Vans até à Adidas, sabrinas,
chinelas, casacos que saiam do padrão a que estava acostumada, malas, algumas
camisas e t-shirts (umas que seguiam
a sua onda descontraída e calma, outras mais elegantes e chiques), malas,
relógios, calções de cintura subida e mais calças de ganga e alguns acessórios
que ela duvidava vir a vestir algum dia. Maria não sabia quanto dinheiro tinha
gasto com aquelas compras mas não estava preocupada de todo. Para além do
dinheiro que guardou dos dois anos que trabalhou no orfanato, Maria tinha
também uma boa quantia guardada que arremessou de uma lotaria popular. Para já,
dinheiro não era algo que lhe fizesse falta.
Quando
chegou a casa, Jon não estava mas tinha deixado uma carta para ela em cima da
mesa do hall.
“Maria,
Como já
sabes, fui fazer o meu trabalho. Volto às 20h.
Podes
usar as roupas da minha mãe se ainda estiveres interessada. O ferro de engomar
está na dispensa.
Xoxo.
Jon.”
Maria
fez o jantar mais cedo, para ter tempo de jantar e de se despachar antes que
Jon chegasse a casa. Queria estar pronta já quando ele chegasse. Tomou um banho
de imersão quente, que a ajudou a relaxar de depois passou pelo corpo um creme
hidratante – algo que era raro fazer. Penteou o seu longo cabelo que lhe dava
até depois do meio das costas e deixou-o secar ao natural, para que ficasse com
as formas perfeitas, como ela tanto gostava. Passou apenas um rímel para
enaltecer ainda mais as suas longas e volumosas pestanas mas nenhum outro tipo
de maquilhagem cruzou a sua pele. Maquilhar-se era algo que ela jamais se
imaginava a fazer. Vestiu um soutien
preto e umas cuecas brasileiras a fazer conjunto e passou o vestido a ferro,
enquanto deixava o seu corpo absorver o creme. Na verdade, Maria não se podia
queixar em relação aos seus genes: era magra (media 1,64m e pesava quarenta e
oito quilos), as suas pernas eram finas e a sua barriga lisa; o melhor de tudo
era que ela nunca teve de se esforçar para tal. Quando achou que nenhum vinco
manchava o seu vestido preto, Maria vestiu-o em frente ao espelho,
observando-se durante uns instantes. O vestido dava-lhe por cima do joelho e a
sua cintura era acentuada, assim como o seu peito devido ao imenso decote; não que
ela tivesse peito porque não o tinha mas a sua experiência como leitora assídua
de revistas de moda dizia-lhe que aquele tipo de decote lhe ia ficar bem.
Deixou cair o seu cabelo meio seco para a frente, cabelo esse que lhe cobriu o
peito e ficou satisfeita com o resultado. Ia para um casino e, embora não
soubesse o que isso implicaria, queria causar boa impressão.
Jon
chegou não muito tempo depois. Trazia o seu habitual casaco de cabedal e o seu
cabelo vinha despenteado, talvez por causa do vento. Maria queria parecer o
mais natural possível mas isso revelou-se uma tarefa difícil; estava expectante
em relação à sua opinião. Assim que Jon a encarou, tão elegante e esbelta a
apoiar-se naqueles saltos altos que ele nunca imaginaria nela, sentiu um fio de
calor percorrer-lhe o corpo. Maria estava deslumbrante! E esse adjetivo não
parava de circular na sua cabeça. Por uns instantes, sentiu-se sem jeito
enquanto a olhava mas conseguiu recompor-se e começou a elogia-la.
- Bem… -
Coçou a cabeça – Estás… linda!
Maria
sorriu desajeitada. Não estava habituada a ouvir elogios e não sabia que eles
sabiam tão bem.
- Está
aqui o teu jantar… - Ajeitou o prato com o jantar de Jon em cima da mesa – Eu
já comi!
Maria
procurava andar sem chamar a atenção mas a pouca experiência que tinha com
sapatos de salto tornava a situação um tanto ou quanto divertida. Jon sentou-se
à mesa, escondendo por entre os lábios um sorriso divertido mas, ao mesmo
tempo, derretido.
Chegaram
ao casino já passava da hora marcada por Lopez.
Jon
tinha vestido umas calças de ganga e uma camisa branca, conjugado com uns
sapatos de cerimónia que ele tinha lá por casa. Aquele toque mais requintado
fez Maria suspirar; não parava de pensar no quão charmoso ele estava e no quão
bem o seu perfume cheirava. Jon, por sua vez, sentia-se agoniado. Tentaria
qualquer outra coisa para não ter de inclui-la nos esquemas do seu chefe. Mas
também tinha plena consciência que qualquer tentativa poderia correr-lhe
extremamente mal. Deixá-lo-ia dizer tudo o que descobrira acerca da sua
misteriosa hóspede e depois tentaria arranjar uma moeda de troca para não
envolver Maria no assunto. Olhava para ela e tudo lhe parecia tão inocente e
ingénuo que ele jamais apostaria que ela conseguisse sobreviver naquele mundo.
Maria
passou o braço à volta do de Jon, à medida que entravam no casino. Aquele
cenário imponente, requintado e luxuoso intimidava-a. Sentia-se tão pequena no
meio de toda aquela imensidão que um pequeno mal-estar começou a tomar conta de
si. No meio de todas aquelas máquinas e de todos aqueles viciados no jogo, que
alguns pareciam lá estar talvez há dias seguidos, Jon encontrou Lopez, rodeado
dos seus capangas e com April por perto. Felizmente, Maria não o viu mas Lopez
já tinha dado por ele. Acenou-lhe levemente, lançando-lhe um sorriso irónico e
Jon foi obrigado a arranjar uma desculpa para que se pudesse ausentar sem Maria
desconfiar.
- Não
queres jogar a nada?
Maria
abanou a cabeça. As pessoas ali dentro não lhe inspiravam confiança e não se
sentiria bem sozinha.
- Ok mas
eu tenho mesmo de ir à casa de banho! – “A típica desculpa da casa de banho!”,
pensou, desejando que ela não percebesse – Encontro-te aqui?
- Sim,
sim, vou jogar a qualquer coisa nesta zona, então…
Jon
afastou-se, em direção a Lopez mas só se adiantou mais quando achou que aquele
ângulo era imperceptível para Maria.
Lopez
estava sentado numa mesa de poker, com dois seguranças a circunda-lo. A sua
figura era a típica de homem da noite com um toque de motoqueiro: camisa preta,
blusão de cabedal, calças de fato e sapatos de cerimónia devidamente
engraxados. Fumava um charuto enquanto o fumo que emanava desaparecia no seu
cabelo, repuxado para trás tal era a quantidade de gel.
- Oh amigo
Jon!
Perante aquela
falsa alegria do seu superior, Jon quase não conseguiu evitar o seu desagrado. Não
proferiu uma única palavra e Lopez continuou o seu discurso, sempre com um
sorriso irritante nos lábios.
- Vejo
que a tua menina está mais… - Olhou para April, à espera que a palavra certa
lhe aparecesse – Menina!
- Deixa
a Maria fora disto!
O aviso não
lhe saiu tão alto e ameaçador como ele pretendia; não queria dar nas vistas, não
queria mostrar-se intimidado mas o receio que lhe percorria a espinha falou
mais alto. Lopez era, sem dúvida, intimidante. Não havia como não ter medo dele
e das suas artimanhas.
- Pois
bem, Jonny Boy – Jon odiava quando ele o tratava daquela forma mas não se
manifestou – Aqui a April e eu descobrimos umas coisas interessantes acerca da tua
hóspede vinda do Louisiana – April fitou Jon, esperando que ele a encarasse mas
ele não o fez. Estava enojado daquela rapariga, alguém em quem ele já tinha
confiado – A verdade meu amigo, é que ela nos pode ser extremamente valiosa!
- O que
queres dizer com isso?
Um sorriso
de contentamento rasgou o rosto de Lopez.
- Quero
dizer… - Cartas rodavam nas suas mãos como se de uma brincadeira se tratasse –
Quero dizer que a tua amiguinha é filha do Portman! O meu ex fornecedor! – A sua
mão bateu na mesa de poker, fazendo Jon estremecer – Aquele sacana… - Murmurou
com um rasgo de fúria a trespassar-lhe a voz mas a mão de April pousou no seu
ombro, acalmando-o – Ele deve-me mais de um milhão de dólares, percebes? Fazes ideia
do que são um milhão de dólares? A tua sorte miúdo foi que o teu carregamento
não valia nem metade disso… Mas esse dinheiro não deixava de ser importante –
Reconsiderou, visivelmente mais calmo – Mas sobre esse assunto falaremos noutra
altura, agora o que quero que tu faças é manter a miúda em Galveston mas mais
importante – Sublinhou as palavras “mais importante” – é fazeres com que ela
decida finalmente apresentar-se aos pais.
- Já que
ela anda ali a rondar e nunca é capaz de tomar iniciativa… - April interveio,
revirando os olhos ao fazer notar a fraqueza de Maria.
- Como é
que vocês sabem tudo isso?
- Tens
de dizer-lhe para ela não confiar tanto nas pessoas que encontra na rua! –
Lopez piscou-lhe o olho, deixando-o furioso por dentro.
- E se
eu não quiser fazer isso?
Jon não queria
pô-lo à prova pois sabia bem do que ele era capaz e também sabia que ele usaria
Maria como isco para chegar até Portman. Fazer parte desse esquema condená-lo-ia.
Mas que outra alternativa teria? Lopez sabia tudo sobre a sua vida e qualquer
tentativa que fizesse para se rebelar poderia ser o passaporte direto para o
caixão. No entanto, não sabia se seria capaz de fazer isso com Maria, tão
inocente, tão ingénua…
- Acho
que não te resta alternativa. – Proferiu Lopez, encerrando por ali a
conversação.
Aqui vos deixo mais um capítulo! Quero pedir desculpa pela demora mas estive de férias e não consegui postar mais cedo! Quero também agradecer o cada vez maior número de visualizações, muito obrigado a todos!